"you don't choose the things you believe in, they choose you."

Minority Report (2002)

jueves, mayo 25, 2006

angel of silence: dois anos
restos imortais

E você me pergunta agora de que valeu tudo isso? Eu te repondo: valeu muito para mim. Mesmo tendo chegado ao fim. Porque as risadas que demos juntos não foram falsas, foram gargalhadas desferidas com muita satisfação e cumplicidade. Porque as pizzas e lasanhas que comemos juntos aconchegados em nossa cama eram simples e sem pompa nenhuma, mas tinham muito mais sabor do que aquelas que desfrutamos em qualquer restaurante italiano. Porque os fins de semana que passei em sua companhia foram muito mais divertidos do que o tempo do colégio, da escola, da faculdade e valeram mais do que quaisquer viagens de férias a Disney ou a Paris ou Buenos Aires ou qualquer praia deste nosso vasto litoral, sem sombra de dúvida. Porque as tardes em frente ao vídeo K-7 vendo e revendo filmes antigos foram muito mais interessantes do que qualquer ida ao cinema para assistir aos blockbusters da temporada. Porque a marca de teus dedos e tuas impressões digitais repousam até hoje firmes na pele de meu braço esquerdo por conta dos apertos que você dava quando se assustava assistindo filmes de terror. Porque o cheiro de teu perfume ainda povoa meus lençóis e travesseiros inundando meu quarto e me fazendo lembrar de cada noite que deixamos de sair em companhia de nossos amigos para ficarmos a sós. Porque as madrugadas que rasgamos juntos naquela cama que tantas vezes teve de ser concertada pela manhã ocupam lances enormes de memórias que nunca serão apagadas ou reescritas por ninguém mais que não seja você. Elas foram mais aprazíveis do que todas as festas e baladas e noitadas e luais e reuniões de amigos e happy hours dos colegas de trabalho e peladas com os colegas do colégio e sarais e sessões de teatro ou de cinema ou shows de rock ou de MPB ou conversas de barzinho ou qualquer outra coisa que já tenha feito ou que venha a fazer. Porque o efeito daquelas noites ainda ressona demasiado forte nas minhas vísceras, na minha cútis, no meu humor, na minha vaidade. Por que nada do que passamos foi em vão? Porque foi inigualável e insubstituível. Porque foi único em todas as formas. Porque, por mais que o tempo tenha passado, por um dado momento, congelado por eras em meus sentidos, nós bebemos do supra-sumo do que se pode esperar de uma iteração entre dois seres. Porque, mesmo que tudo hoje seja findo, nós podemos levar conosco para sempre a noção real e palpável do que pode ser a felicidade. Não, nada na nossa história, do inicio ao fim, pode ser dito em vão. Digo que não. Porque vou viver feliz até o último dos meus dias por ter a certeza de que vivi algo tão forte que tempo algum será capaz de apagar. Porque ninguém será capaz de fazê-la esquecer-me nem por um instante, assim como aqui, em mim, você jamais terá substituta á altura. Porque cada uma das nossas noites foi insuperável em sabor e candura. Porque, por mais que me esforce, não sou capaz de pensar em você de nenhuma forma que não seja minha. Minha amante, minha mulher, ou simplesmente minha. No sentido mais forte que esta palavra possa ter. Porque noites em claro, do escurecer ao raiar do dia, ao lado de quem se ama, não são apagadas da lembrança como os dados de um disquete mofado. Porque se fosse só pela comodidade de um orgasmo matinal resolveria meu problema sozinho sem ter de me ocupar do seu prazer exigente. Porque era no seu prazer exigente onde realmente residia a minha satisfação. Porque poucos homens sabem dar prazer e realmente satisfazer uma mulher. Porque muitas mulheres já me viram gozar, mas poucas foram capazes de me fazer sentir prazer de verdade.

miércoles, mayo 17, 2006

três pontos
na arquitetura de um paliativo

Eu sei que não é você. Desde o primeiro instante eu já sabia. Não, eu não quis nem tentei me enganar. Sabia desde o princípio o que estava fazendo e o que estava acontecendo. E sabia também que não era você. Mas me permiti a cometer este erro (se é que se pode chamar algo assim de erro) por acreditar que viver vale mais a pena do que planejar futuros perfeitos e porque não pretendo esperar como um vegetal ambulante pela pessoa que vai caber em meus sonhos absolutamente inerte no trono do meu apartamento até que a morte chegue. Ela pode chegar antes e, além do mais, viver é viver. Me acostumei a divagar através de máximas e axiomas, tanto meus quanto alheios. Não desisti ainda. Estou muito jovem para isso e a minha natureza sedenta por paixões e emoções não me permitiria. Mas procurar demais cansa, e às vezes da vontade mesmo é sentar e esperar. Até porque já me dei conta que as pessoas certas só aparecem quando não estão sendo esperadas (ou procuradas). Nessas horas a solidão é o pior refúgio e ter o meu corpo como cárcere privado só me dá barato em situações especificamente momentosas. Embora já tenha desenvolvido inúmeros métodos para manter-me concentrado em mim mesmo (uma postura um tanto egocêntrica, é verdade), burlando o tédio a partir de elementos interiormente montados e planejados para estarem sempre a disposição. Aquele gosto amargo e seco de solidão que nos impele incontrolavelmente na direção de outrem continua vindo à tona de repente, e ainda que continue a ser uma árdua tarefa diligentemente evitá-la, esta amargura não é inesperada e, portanto, não está além de qualquer controle. Fato este que traz você, inexoravelmente, aqui. Sim, eu sei que não é você, mas isso não torna o seu beijo menos adocicado e sua pele menos macia. Não é você aquela que me trará conforto nos dias de grande tormento, aquela que fará meus brios tremerem intensamente em resposta a um toque levemente sutil e incendiário, que desafiará meus instintos mais primitivos com sua sensualidade, a minha personalidade mais intensamente arredia com seu toque de genialidade e a minha incansável proficiência com sua inteligência esguia e sua ironia e sarcasmo. Não, definitivamente, não é na sua companhia que desejava comer pipoca na cama assistindo um filme de aventura despretensioso enlaçado em um abraço aconchegante e ébrio de carinho. Não é o seu corpo que deveria estar ao meu lado requentando meus lençóis no frio do inverno, mas o seu calor, por hora, já é gostoso o bastante. E experimentando mais uma vez o frescor de teus lábios divago leve, nadando entre meus aforismos de estimação. Enquanto não encontro a pessoa certa, sigo divertindo-me com as erradas. Evidentemente, com tudo às claras. Para que nunca venha a culpar-me de tê-la ludibriado. Nosso caso segue assim, um pacto. Desde que você aceite aproveitar de mim o que tenho a oferecer-lhe. Escolha. A escolha é a mãe de todas as questões. Em todo caso, daqui pra frente, a responsabilidade é unicamente sua. Pois, infelizmente, ainda não foi dessa vez.

lunes, mayo 08, 2006

divagar impreciso
noite de domingo

20:54. Eu só queria já estar em casa, em cima do meu quarto e dentro da minha cama, ou quase isso. Vejo no vidro da janela do ônibus um reflexo translúcido do meu rosto enquanto atravesso uma região desconhecida do itinerário que me faz recordar um bairro onde jamais estive da cidade onde nasci e que não visito há tempos. Uma estranha sensação de deja vu às avessas. Os escassos raios de luz artificial emitidos pelos tubos fluorescentes montam uma imagem de aspecto bizarro no lado de dentro da janela ao meu lado. Um rosto pálido e cansado. Cara limpa, cabelos penteados e barba feita. Os olhos fundos e o semblante abatido são as marcas que não podem ser apagadas por um banho. Marcas de dias de profundo desgaste físico e psicológico. Relatos em minha pele de uma vida dupla marginal. Meio séria, meio vagabunda. O ardor nos olhos e as dores nos músculos são os efeitos psicossomáticos dos males profundos que se abatem sobre minha consciência num fim de noite como este. Um ponto final de profundidade numa oração superficial de duas noites e dois dias de prazeres vãos. São momentos assim que levam minha mente a divagar de forma imprecisa e disforme. Formulando sentenças que se iniciam pelo meio buscando sempre um inicio lógico sem nunca chegar ao fim. Sendo freqüentemente interrompidas pela metade. Seja lá onde for a metade de algo que não começa e nem mesmo termina. É sempre em momentos assim que as idéias tomam forma em minha mente liquefeita que se expande em inconsciência para tentar contê-las. Inutilmente. Desço do ônibus e perco a imagem que me acompanhava da janela para passar a interagir com ela. Sinto o bafo gélido que a noite sopra em meu pescoço dolorido ressecar a minha pele e meus lábios já bastante machucados. Sigo colhendo trechos de conversas e fragmentos de memória, reagrupando-os com a ajuda dos agentes inanimados das calçadas semi-desertas da noite úmida e fria para compor frases de filosofia volúvel, edificadas com palavras que se perdem no soprar dos ventos em meus cabelos e no barulho dos carros que cruzam meu caminho para casa. Os versos que construo com precisão milimétrica se desmontam em contato com o ar e se desfazem na brisa sob a penumbra de um poste que teima em piscar de forma quase estroboscópica, atordoando minha visão já comprometida pelo cansaço e pelo sono. Instante em que me reconheço frágil por ser tão dependente de uma máquina estúpida como um computador para guardar em pastilhas de silício e discos magnéticos tudo aquilo que minha imaginação de ciclos incontáveis consegue produzir numa velocidade maior do que minha memória volátil pode armazenar de forma segura. Como a maioria das palavras que organizo de forma poética, dialética, apaixonada ou crônica que nunca são lidas por ninguém, pois se perdem no esquecimento do vão infinito de minha subconsciência. Assim como as frases que desfiro neste exato momento. Abro o portão de ferro. O barulho é tão incômodo que meus ouvidos parecem querer desligar. Meu equilíbrio, já comprometido, sofre um rápido apagão entre os degraus de um dos lances intermináveis de escadas que parecem crescer cada vez mais. O abrir da porta gera um alívio imensurável e indescritível. O turbilhão de emoções desconexas se desfaz diante da visão de cotidiano atordoante que invade minhas retinas. A bagunça na sala assusta, o cheiro no banheiro incomoda, a louça na pia aterroriza pela perspectiva. Os últimos restos de memórias remanescentes dos dias que parecem não querer ir. As roupas jogadas e o cheiro de perfume, feromônio e secreções que toma o quarto já nem são perceptíveis. A cama desfeita há dias como se aguardando pela minha chegada, pronta para me receber de braços abertos. Pego uma revista em quadrinhos e apago sobre ela ainda na quinta página. Segunda-feira pela manhã todas as escalas terão retornado a zero.

viernes, mayo 05, 2006

três pontos
Talking About

Falo de dor e tristeza porque a beleza da vida não é capaz de despertar a mesma comoção a meus olhos desgastados de tanto observar um mundo injusto
(ou talvez por não encontrar inspiração no que me é cotidiano)

Falo da maldade humana por acreditar que não exista ser vivo mais egoísta e incapaz de disseminar a bondade do que estes mamíferos que caminham eretos sobre a superfície há poucos milhões de anos e já se sentem donos de tudo
(ou talvez por acreditar que falar de caridade e boas ações não me daria tanto ibope)

Falo do meu ódio às injustiças porque não acredito que alimentar este ódio em meu peito vá realmente me fazer algum mal físico
(ou talvez por medo de confessar amor pelas pessoas a minha volta)

Falo de mentiras e traições porque não acredito em fidelidade e nem na sinceridade das pessoas e suas relações de troca e interesse
(ou talvez para não parecer fraco ao ser sincero com as pessoas que gosto)

Falo de amores que nunca tive por falta de alguém de verdade para amar
(ou porque ninguém acreditaria nas histórias fantásticas dos amores que realmente vivi)

martes, mayo 02, 2006

três pontos
Números

Sempre que desconecto a mente do trabalho deixo o pensamento percorrer caminhos tortuosos.
Hora levado pelo vento, hora montado na imaginação, muitas vezes na inspiradora vontade de ser livre.
Outras sendo guiado pela minha geométrica percepção do mundo a minha volta, fortemente distorcida pela sua influência.
Cavalgo a esmo pelo deserto de recordações suas, contando aquelas que permanecem comigo.

Conto as horas que passo ao lado do telefone a espera de uma ligação.
Me perco em meio aos meus dedos enquanto a conta trafega para o infinito.
Estouro o número de bits a que tenho direito em meu corpo e recomeço a contagem.
Desisto, já perdidas as vezes em que voltei de dez a zero em menos de uma semana.

Percorro a agenda do celular tocando em um punhado de números que me trariam você.
Casa, celular, trabalho, escola, amigas, vizinha, mãe... um amontoado de códigos anexados a um nome que, não parece, mas fazem todo o sentido para mim.
Recolho notas de compra, de contas, de ligações infrutíferas, de gastos de meu tempo vão,
que perdeu a linearidade dias atrás, quando passou a caminhar a esmo seguindo memórias sem data, sem relógio, sem direção.

Circulo por caminhos já atravessados e tempos já idos, recolhendo os cacos de meu ego desfragmentado, deixados como trilhas intermináveis ao longo dos caminhos que me levaram a você.
Frações de um ser incompleto que você rejeitou enquanto descascava minha mente diluída.
Me moldando, me formatando, me arredondando. Apenas para facilitar os cálculos.

Recomponho-me em meio aquele punhado de nomes e números codificados em um pequeno e apertado display.
Anoto, calculo, reconto os beijos que te dei, o número vezes que te toquei, as partes de teu corpo que acariciei.
Quantas palavras trocadas, quantas promessas quebradas, quantas noites vividas, quantas manhãs interrompidas.
Flashes de memórias que me torturam com os pensamentos errantes que percorrem os labirintos de minha mente.

Números números números...
por que penso tão melhor em meio a criptografia dos teus números?
Números são apenas números...
e os números são sempre tão frios...