"you don't choose the things you believe in, they choose you."

Minority Report (2002)

domingo, junio 05, 2016

três pontos
sob um leve desespero...

estou com sintomas de saudade, estou pensando em você...
toda vez que tento me refazer inteiro, rejuntar os cacos do meu inconsciente despedaçado pelas vicissitudes e tormentas que me cercam. a vida torna a me destroçar como uma pedra na vidraça, deixando mais e mais estilhaços pelo caminho. toda vez que penso me recompor das perdas passadas, dos desfalques em minha integridade, dos desejos frustrados, dos cinismos covardes, ela volta a me empurrar pelos mesmos erros jogados na minha cara como se quisesse me lembrar do quanto sou incapaz de os evitar cometer. de novo e de novo. toda vez que a desilusão me atormenta, o desespero me toma de assalto e se encaixa confortável em meu peito, me distraindo da solidão e me permitindo obter um traço de paz de espírito, ela me joga um balde quente de esperança renovada que destrói minhas certezas, desmonta meus sentidos, quebra meu silêncio e me joga de volta no abismo das promessas de felicidade que sempre vêm e se vão. pendulando sobre meu peito e me trazendo a mesma angustiante vertigem apaixonada. pela vida, pelo amor, pelo desejo de ser inteiro, pela saudade de algo que nunca vivi. a aflição com um futuro incerto de prazeres virtuosos, como raros hão de o ser, flutua condensando meu coração em um peso tonelar, que com tanto impulso, se põe a girar e girar. imparável, insistente, atormentado. escorrego na velha espiral que me destrona de toda a racionalidade e me joga na dor inflexível do girar de um parafuso sem fim. que mais e mais me aperta a alma no interior do meu peito condensado e cravejado de lágrimas secas e amargas. lâminas que perfuram minha dor com venenos atordoantes. quando pensei estar me curando de tantos planos mau cumpridos, a vida me traz você. de onde menos poderia esperar, você me atinge como uma bala perdida, clamando por afeto, crivando sua marca em minha pele e inflando meus sonhos enquanto se encaixa neles tão perfeitamente quanto se encaixa seu corpo em mim. sua alma, sua mente, preenchendo as lacunas de meu ser atormentado pela sangria desvairada de um amor que já não mais pensava ainda sobrar em mim. desatino de desejo por sua mente tão complexa, por sua alma tão docemente apertada, me pedindo paixão. clamando ser parte da minha. Numa conexão mental que vai além do que se pode imaginar o desejo mundano comum. Incapaz de compreender a beleza inebriante de uma paixão que arde na mente enquanto ressona pela alma e reverbera pelo corpo causando pânico e terror. medo de perder o que sequer se tem. duas almas que se tocam como uma só fosse. se mesclando, misturando, confundindo. sendo você tão eu. e eu, aqui, já tão seu. como punir um amor tão puro que se fez carne? como não temer uma paixão que tanto arde? como não viver um amor que tanta vida faz pulsar em minh'alma já tão tarde?

miércoles, junio 01, 2016

divagar impreciso
eu, o tempo e o vento...

não tenho medo do escuro, mas deixe as luzes acesas
nunca fui bom em esperar. minha relação conturbada com o tempo, minha ansiedade que me desconecta do presente e me invade com um jorrar torrencial de adrenalina me impede de simplesmente ser. ser enquanto o tempo é. pois costumeiramente tenho dom de me transportar do agora para o antes ou, mais frequentemente, me perco nos labirintos de um depois infinito de possibilidades. me agarro ao que houver de pior. busco no fundo de minh’alma uma fuga para a obsessiva vontade de controlar o tempo, mas toda vez que duelo com ele, ele me derruba. me avisando que, inexoravelmente, irá sempre ser o senhor do meu destino. e que não há poder algum sobre a terra capaz de destroná-lo e me dar qualquer lampejo de ordem. sou puro caos, desfeito entre os pedaços do tempo que ainda não é. apavorado com um mundo que ainda não é. vagando entre estradas que se cruzam e, cada vez mais me desconectam da realidade que construo com minhas escolhas. as quais, invariavelmente, me conduzem aos mesmos erros que repito insistentemente na vã esperança de obter diferente resultado para ações que me tomam. que me tornam sem controle algum. mas quando o solfejar do vento me devasta com o seu perfume, me ancora no que é. no que somos. juntos, embora separados e desejosos de nós mesmos. vejo-o lamber os seus cabelos e sonho com o dia em que meus dedos deslizam por entre eles banido de culpas e livre de tormentos. sonho. e meus sonhos me conduzem de volta ao vazio do tempo que não é. sofrer caoticamente pelas possibilidades de ter e não ter. de poder e não poder. pela pura invariável incerteza. a incerteza me move, mas me corrói por dentro. as certezas me paralisam, mas me trazem paz. uma que me parece levar você pra longe. definitivamente. então escolho o caos, a dor, a solidão do não saber, o desespero do não poder conter o esperar em mim, a angustia de uma esperança perdida em um tempo que não me é. uma dor dilacerante por esperar ter o que me parece proibido mesmo que me oferecido de bom grado. um descompasso... atravessado pela frustrante verdade de que não mais tenho controle de mim, projetado que estou em um tempo em que seria feliz. simplesmente não o sou... sem você por aqui.

lunes, mayo 25, 2009

divagar impreciso
A Volta do Parafuso

Penso nas voltas que a vida dá e nas voltas que, muitas vezes, ela nos dá. Pressionando-nos como um parafuso ou nos aliviando como a um pião. Perpetuando incertezas que se desfazem e refazem ao sabor do giro do mundo que construímos em torno de nós mesmos. Trafego por entre as reviravoltas da vida que se desenrola como uma espiral cambaleante, tropeçando por sob as ondas que me golpeiam, me engolfam, enquanto ainda procuro aprender a surfar. Tomando caldos, retorno sempre a esse movimento helicoidal descendente cuja força centrípeta me comprime ansiosa e me desaloja de toda e qualquer intimidade com o mundo que me cerca. Inapto a reconhecer tantas formas estranhas de carinho manifestas por uma sociedade que se contorce com movimentos caóticos provocados por uma massa que se ‘disforma’ numa triste tentativa de se individualizar sempre mais, impondo regras e limites à pluralidade que se manifesta cada vez mais através de bolhas de conforto que impedem o entrelaçamento das vidas que não se tocam mais que superficialmente, eu me torno incompreensível em minha ótica absurda que busca satisfação no substancial que só se faz visível nos recônditos mais obscuros da alma. Busco a profundidade e nela me afogo, por não encontrar onde pisar. Saio procurando, tateando, vacilando, tentando alcançar das pessoas o que jaz confinado no lado escuro de suas mentes. Um toque humano de esperança capaz de sobrepujar o medo que nos assola dos seres ao nosso redor. Luto contra meus desejos e me vejo cair. Tento me ater a uma fé que me liberte, mas não me livro das amarras da solidão. A solidão cinzenta de que usufruímos em meio às massas. Atravesso meus percalços como se já não mais importassem e finjo superá-los. Permeio relações descartáveis como se isso me bastasse. Transito por entre amores genéricos ou reciclados enquanto busco por um viver maior do que o prazer. Como se fosse possível haver amor recíproco num mundo tomado pela desconfiança no próprio desejo. Tento me refazer, recompondo os destroços esquecidos pelo caminho em meio às vicissitudes da vida que me moldaram em algo insólito que ainda hoje tenta se perceber. Trazer de volta um ‘eu’ que se perdeu entre os labirintos de uma mente fluida, mas desacreditada e decepcionada com as pessoas. Tomo impulso para tentar emergir, ensaio respirar de novo, mas caio de volta na espiral descendente que me toma nos braços e me suga para a sua zona de conforto que já não mais me comporta, me comprime e me faz implodir. Sinto o golpear, na boca do estomago, da vida que teima em pulsar errática em minhas artérias. Queimando e ebulindo esse desejo que me sustenta tanto vícios quanto virtudes. Me agarro a esse fio de percepção e tomo fôlego para encarar mais um dia. Fazendo força para dividir minhas atenções com o mundo, as imagens que faço dele e o outro mundo que habita em mim, tentando preencher as lacunas entre os pedaços da minha vida. Busco uma vez mais sorver ar puro, por mais que me faça arder os pulmões. Sustar o solfejar melancólico da solidão que me sufoca com delírios e anseios vãos para restaurar a conexão comigo mesmo e com a realidade à minha volta. Pouco a pouco, passo a passo, me reconstruo e recrio esse mundo dentro de mim. Um dia de cada vez.

jueves, diciembre 27, 2007

três pontos
Perfeita

Se eu fosse um homem de verdade, e não esse híbrido de pária e quasímodo humano que sou, iria até lá, a seguraria pela mão e diria, de uma vez, tudo aquilo que tenho vontade. Desde o primeiro dia em que a vi. Desde a primeira vez em que ela me tocou. Desde que me olhou com aqueles lindos olhos grandes e me fez desabar por completo do alto de mim mesmo. Com seu jeito meigo de falar, seus gestos delicados e, por vezes, desajeitados. Com aquela gargalhada gostosa que me dá uma vontade de sorrir que aperta o coração. Uma beleza mista, tão sexy quanto angelical, com um leve toque de selvageria e desleixo. E aquele olhar firme, petrificante, de quem sabe aonde pode ir e também onde quer chegar. Capaz de me esquentar e congelar ao mesmo tempo. E me reverter a um estado pré-adolescente, insípido e covarde. Inseguro, imaturo, imberbe, insuficiente, inútil. Ela podia ser chata. Besta, arrogante, metida, fresca. Mas não: é a criatura mais doce que já pisou sobre a crosta terrestre, pelo menos nos últimos 200 anos. Um tanto atrevida, é verdade. O que só a torna ainda mais encantadora. A mulher mais bela que já vi na minha vida. E olha que já estudei em colégio de padre e meu pai já foi assinante da playboy. Um metro e sessenta e cinco da mais pura perfeição, na forma da garota mais incrível que eu, há muito, já julgava inexistente. A boca que parece desenhada milimetricamente pela mão de Deus. Um corpo que parece ter sido esculpido do próprio barro divino do Olímpo. E os seios com as exatas dimensões que só se viu um dia no projeto original da própria Eva. Descrever assim parece tolo (mas quem não ficaria bobo diante de tal vislumbre?), mas esse é o grande fascínio das palavras. Elas codificam as imagens, emoções e sentimentos e transmitem em forma de texto. É como uma criptografia de traduções imprecisas. Com algoritmos que podem ser decodificados por qualquer um, mediante a concepção do receptáculo. Enfim, por mais que eu tente descrever, você não conseguiria visualizar a imagem que eu vi. Mas certamente pode entender, a partir da sua própria imagem, a perfeição daquilo que eu vi. E pode supor a sensação que me percorreu a espinha quando me viu, escondido ali naquele canto isolado do bar. Fazendo-me tremer como um garoto assustado quando caminhou em minha direção, com aquele jeito de olhar, um sorriso de menina levada e a desenvoltura de uma deusa. Mulher feita da mais pura essência feminina. Sexy, inteligente, desprotegida e devastadora. Chegou até perto da mesa e falou, com aquela voz que deslizava pelos meus ouvidos como fina seda, enquanto acariciava meus cabelos com seu toque de veludo quente que despia meu pescoço:

– acho que te achei escondido aí nesse canto.
– engraçado. eu tinha certeza de que era eu quem estava te procurando. bem aqui. a vida toda!
– nossa!! eu vim até aqui disposta a te dar uma cantada, mas acho que você me venceu nessa.
– isso não é uma disputa.
– então por que você ainda não me deu um beijo?
– estava esperando apenas você pedir.
– eu não pedi!
– então tenho que pedir eu mesmo.
– só vem aqui e pega o que é teu!

Perfeita... o que mais eu poderia dizer?

miércoles, noviembre 07, 2007

rapsódia romântica
Karma

É... esse é um daqueles momentos em que eu costumo parar na frente do espelho, respirar fundo, olhar para essa minha cara de ‘tacho’ e dizer em alto e bom som: “é velho... agora fudeu!!” e é bem por aí... Os sintomas eu já conheço há tempos. Acostumei-me a vivê-los ao longo da puberdade e já há tempos que os mesmos não tornam a incomodar. Parecia uma vacina. Você passa por isso umas duas ou três vezes e fica calejado e imune. Ledo engano. Acabo de ter uma recaída. Maldita recaída. Os sintomas foram se manifestando pouco a pouco, de modo a não criar alarde, pois isso poderia atrapalhar a proliferação da ‘coisa’ através de meus genes. Um leve interesse em procurar saber alguns detalhes logo se transformara numa ansiedade tamanha pela sua chegada a cada atraso de poucos minutos. Tava na cara que isso só podia dar em merda. Depois veio aquela subserviência despretensiosa e sem sentido. Aqueles instantes a mais em que você fica no local que já deveria ter deixado só para ocupar mais alguns minutos de companhia. O próximo passo já seria crucial. E maldita foi a hora em que me propus a acompanhá-la até sua casa. Dali já não tinha mais jeito, e eu já sabia disso, mas não imaginei que fosse tão grave. Logo viria o convite para sair, as conversas mais longas, a curiosidade mútua em querer saber, querer entender, querer perguntar e de repente eu já queria tudo. E vem o calafrio quando a vejo no fim do corredor, a ânsia de que a noite passe para revê-la no dia seguinte e, o pior de todos os males, as horas intermináveis a espera de um telefonema. As reações envolvidas são determinantes. Nesse caso são as piores possíveis. E aí eu pergunto: “puta que pariu!! Tá vendo onde você foi se meter?” Agora é tarde. Voltar atrás é um caminho penoso e sofrível e eu não quero segui-lo. Seguir em frente é um caminho onde a direção se perde nas mãos alheias. E agora!? Fazer o quê!? O que é que eu faço quando você não me liga se já faz tanto tempo que esperar ligações alheias já não me causa o menor desconforto? O que é que eu faço se você não aparece se já faz tanto tempo que não sinto esse tremor na espinha ao esperar por quem quer que seja? O que é que eu faço quando encontro suas amigas no corredor e aquela vontade sem limites de perguntar por você vem à tona e eu quase não sei mais como segurar se já faz tanto tempo que não pergunto mais por ninguém e apenas escuto perguntarem por mim? Deve ser o que chamam de justiça poética, ou divina, tanto faz... eu pago hoje, com minha ânsia de vômito, pela indiferença que reservei a tantas outras no passado. É como se diz por aí: aqui se faz, aqui se paga. Você, agora, deve ser o meu karma.

martes, octubre 16, 2007

da série
Comédia Romântica

- alô?
- hmmmmmmmmmmpffffff...
- alô?!?!
- hauffffmmmfflôôô...
- Carlos?
- sshhhommm eeu...
- tá tudo bem contigo?
- tá ssshiiiimm...
- que voz é essa??
- ‘va d’miiindu...
- aah... acorda aí, vai!!
- o que é...?
- nada. deu saudades...
- às doze e meia da noite?
- tem hora pra sentir saudade??
- não. claro...
- quero te ver.
- não pode ser amanhã?
- queria que fosse agora...
- eu tava dormindo.
- você não quer me ver?!
- eu?!
- sim.
- ãh... claro. claro... mas não dá pra ser amanhã?
- por que você tá tão estranho??
- eu!? impressão sua...
- você tava dormindo mesmo?
- tava, ué!!
- Carlos, fala a verdade. tem outra mulher aí com você, né?!
- que nóia!! claro que não... eu só tava dormindo.
- então acorda. eu passo aí pra te pegar pra gente comer alguma coisa.
- não! não vem. Eu quero dormir, sério... tô um caco.
- Carlos, fala a verdade. se tiver outra mulher aí com você...
- pára de nóia. não tem ninguém aqui comigo. eu só tava dormindo.
- hmmmmmmm...
- sério. não viaja.
- tem certeza que não quer sair?
- tenho sim. quero dormir. na boa. não fica chateada, por favor.
- tudo bem. então, que tal assim: eu vou até aí agora, faço um sexo oral em você e depois volto pra casa e te deixo dormindo em paz.
- ...
- pode ser??
- claro! quer dizer... bom, se você insiste, tudo bem... vou deixar a porta aberta, ok?!
- não. não precisa. deixa pra lá.
- hein?!
- mudei de idéia. volte a dormir. amanhã a gente se fala.
- ...

miércoles, septiembre 19, 2007

três pontos
Cozinha do Inferno

Circulando pelas ruas abarrotadas da orla em um fim de tarde de outono. Um véu escarlate se apossando do firmamento e se estendendo desde as nuvens esparsas até o horizonte. Desfazendo a cortina cinzenta que enfeita o nosso dia e preludiando o rasgar imutável das constelações noturnas. É a noite se abatendo sobre a cidade, deslizando viscosamente pelas paredes de seus edifícios. Tomando o tempo para si, exigindo a existência como sua. Absorvendo a consciência das pessoas, trazendo-lhes ao seu habitat soturno, obscuro, submundo. É toque de recolher das criaturas diurnas, claras e sem graça. É alvorecer das criaturas do escuro, famintas por diversão e frivolidades. Sedentas por aventura e sacanagem. A cidade noturna emerge do ventre de sua mãe clara. Adquire vida própria e se alastra, perseguindo o breu e as pessoas que o levam a qualquer parte. Falando, gritando, sorrindo, gargalhando e gozando. A cidade sente o ecoar dos gemidos da noite, que circulam por suas ruas e becos escuros, se propagando pelo éter negro que se incorpora a todos os seus cantos, por todos os seus poros, por todos os meus poros. A noite me invade, me possui, percorrendo os torpes corredores da minha mente liquefeita. Mesclando-se aos meus sentidos, de forma simbiótica, sintomática. Tornando-me parte de si e me trazendo seus medos, seus anseios. Fazendo meus os seus desejos mais profundos e pervertidos. A noite é imberbe, é jovial. Mas é sedutora, é faceira, sonhadora e matreira. Ela é caprichosa, e transborda sua sensualidade pelas calçadas, emprestando-a a todos os seus filhos incautos, dotando-os de sua sagacidade marota e imbuindo-os de sua inquietude fugaz e fulminante. Ela altera seus hormônios e feromônios como parte de seu plano para perpetuar-se no seio das sociedades. Fazendo dos herdeiros de seus incansáveis seguidores, herdeiros de si mesma. Incontáveis hordas de adoradores nos rituais noturnos de veneração a sua presença magnânima. A noite é ardilosa. Não se dá por vencida e estende seu domínio sobre as almas que se atrevem a penetrá-la. Levando-as, em chamas, a invadir a dimensão diurna sob seu domínio irresistível e turbulento. Ela nos consome, se alimenta de vida, desejo, violência, libido e medo. Aprisiona a nossa essência e liberta os corpos secos para viver o dia em sua ausência. Aguardando o novo chamado crepuscular que vai trazer-nos de volta à plena consciência, novamente aos seus cuidados e sob a sua influência.

jueves, agosto 30, 2007

divagar impreciso
Recall

é sangue mesmo, não é mertiolate...

A causa daquela insônia que me atormentou por toda a noite de repente passava a se tornar relevante quando, pela manhã, pude observar o hematoma que se formava ao redor daquela junta dolorida. Era apenas um dedo. Um jogo, uma bola, um lance mal desenvolvido e um dedo idiota latejando de madrugada. Antes de qualquer coisa, auto-medicação. Uma passada na farmácia e tudo resolvido. Afinal, era apenas um dedo. Mas, canhoto, uma entorse mal curada poderia me incomodar, não só na quadra, não só na escrita, mas também no trato com o braço da guitarra. Isso já assusta o bastante. Embora seja apenas um dedo. Uma passada no hospital não me faria mal algum, pensei. Hospital público, porque achei que não valia a pena atravessar toda a cidade de carro apenas por causa de um dedo. Achei errado. A urgência é por ali. Lá vou eu. Vou encaminhá-lo à ortopedia. Lá vou eu. Vá por ali bater um raio-x. Lá vou eu. esperaesperaesperaespera... não fosse um setor de consultórios, na certa seria uma visão dantesca. Como àquelas no fim do corredor ao lado. Cheiro de formol. Pessoas vão, pessoas vêm. Pedaços de pessoas passam ao longe. Muletas e pernas remontadas e apertadas com parafusos. O garoto na cadeira da frente levanta a blusa comprida enquanto a sua mãe conversa com a senhora ao lado. Andando de skate. Braço quebrado e mal cicatrizado. Dá até pra ver o antebraço do guri dobrado ao meio como se ali houvesse uma terceira articulação. E eu me lembro do meu dedo. Outro paciente cruzando o corredor para a radiologia com sua perna pendurada com aqueles espetos encravados. E eu com meu dedo para ser examinado. A moça gorda que mal consegue se mover vem numa cadeira de rodas, na verdade uma ‘cama-de-rodas’, sua perna parece ter sido dobrada ao contrário, tem pinos de uma ponta a outra e alguns pares de anéis ao redor para sustentá-los. Dou graças a Deus por não ter tido uma infância sedentária, o que me rendeu algumas escoriações, mas uma certa resistência. Já penso na tala de gesso que terei de usar durante umas duas semanas e percebo que realmente nada no meu corpo é inútil. As tarefas mais simples se tornarão altamente complicadas sem o dedo anular da mão esquerda. Sobretudo a maioria daquelas que se realiza no banheiro. Mais um galeto espetado passa na minha frente e já começo a pensar no que estou fazendo ali. Eu e meu dedo. Já começo a me sentir como se numa oficina autorizada de peças de reposição. Peças quebradas para serem substituídas como se o corpo humano fosse tão simples de se lidar quanto uma máquina. A senhora com sotaque açoriano irritante repete a história de sua vida para a moça ao seu lado, contando como Dr. Roberval fez isso... Dr. Adalberto disse aquilo... Dr. Claudionor aquilo outro... a simplicidade nem sempre é bela. Os simplistas geralmente não se explicam, mas se entendem. Embora isso não torne a sua simplicidade atrativa. O pai que entra no consultório traz os papeis de internação do garoto que se prepara para cirurgia reparadora do antebraço. Meu dedo já não incomoda tanto. A bem da verdade, não fora uma contusão tão grave. Com o formato de meus dedos, que já não foram feitos para usar aliança, depois dessa luxação ficará ainda mais difícil de aceitá-las. Ótima desculpa. Tenho um amigo eletricista que disse para a esposa que quem trabalha com eletricidade não pode usar nada de metal no corpo. Ela aceitou. Eu já não espero tanta compreensão.

jueves, junio 21, 2007

três pontos
Wallpapers

Procuro clicar em algo de mim que me leve a você
Algum atalho escondido na mente que execute você
Antes que meu sistema entre em pane, se torne inoperante
Sem as funções de código que só você aciona em mim

Como posso rodar sem o seu comando
se o meu programa é venerar os teus lábios, se o meu instinto é seguir você
Desde a porta de casa até o infinito e ainda além
Mantenho-me ao lado sugando de seus poros aquilo que me mantém

Gravado em sua pele alva como uma tatuagem
Sou seu papel de parede
te enfeitando as costas
guardado sob suas vestes

Teu corpo, minha área de trabalho
Teu toque, combustível
Me alimento se teus beijos me invadem
Com o perfume suave de rosa rara

Desejo meu de ver você
desejo teu de me ter

Dois anjos em silêncio, olhando para o céu suplicando perdão
Pelo pecado de consumar um amor tão belo
Que de tão puro deveria ser platônico
Deveria ser espírito e não carne

Mas como ser espírito e ignorar toda essa paixão que nos arde?

viernes, mayo 25, 2007

três x quatro
extraindo da costela

pernas... duas. belas. longas, grossas, roliças e bem torneadas. de pele lisa como porcelana e suave como seda. e com pés pequenos, delicados e macios, que se contorcem de cócegas eclodindo numa gargalhada gostosa e reconfortante. seios fartos, não enormes – apenas fartos, com bicos pequenos que se estremecem enquanto os pêlos se ouriçam a um leve carinho molhado na base da orelha. glúteos arredondados, firmes e sensíveis. cintura bem modelada, um pouco atlética, mas sem perder a delicadeza. curvas bem delineadas, daquelas que faz você se perder em devaneios mil e delírios eróticos e aconchegantes. como manhãs de domingo no inverno embaixo do edredom. mãos delicadas de dedos longos e toque arrebatador. uma sensualidade latente, com toques de cuidado maternal e caras e bocas e caretas e gestos eróticos na medida certa. uma boca carnuda, mas pequenina, com uma língua sempre úmida de movimentos terapêuticos e beijo delicioso, sabor de doce de pecado com cobertura cândida de leite condensado. um respirar flutuante, hora tranqüilo, hora ofegante, que desprende dos lábios um som de prazer que faz os ouvidos se desmancharem, desmontando todos os padrões de equilíbrio do corpo. o pescoço longo e o porte elegante contrastam facilmente com seus trejeitos de moleca atrevida, divertida e sorridente. um sorriso de desmanchar qualquer dia ruim. fulgurante, entorpecente, fascinante. bom humor para enfrentar de peito aberto todas as adversidades e aquela paciência que só a paixão nos permite cultivar. um corpo lânguido de formas esguias milimetricamente construídas para me receber. abdômen sarado? não... levemente sedentário e fofinho. uma âncora na realidade, afinal, ela tem de ser perfeita, não utópica. um tanto preguiçosa, só para aumentar o charme de sua meiguice apaixonante, mas sempre bem disposta nas horas certas. um gosto incontrolável por aventuras, mas sem abrir mão de tardes de preguiça e aconchego a dois, hibernando numa cama quente. pele alva rosada e olhos brilhantes. de que cor? verdes... não! azuis... ou melhor, negros de formas amendoadas... ah, isso não importa. o olhar sim. penetrante, firme e desconcertante. daqueles que desmontam suas certezas e te faz querer mergulhar naqueles olhos e nos seus sonhos. um olhar que transmite segurança e, ao mesmo tempo, pede por proteção. desmontando todos os muros edificados à sua frente. cabelos? tanto faz. hoje em dia isso não faz diferença mesmo. todos os tons podem ser pintados de vermelho (é, eu tenho um certa queda por ruivas). personalidade forte. teimosa, geniosa, ousada, lasciva e de posições firmes. inteligente, obstinada e sincera. sem papas na língua, sem meio-termos, sem querer agradar ninguém, nunca. e sarcástica, a ironia tem de correr nas suas veias como corre nas minhas. é a sua versão feminina? talvez, qual é o problema? nunca aceitei essa estória de que os opostos se atraem. não gosto de mulheres santas, nem boazinhas demais. sempre gostei mais da Lilith do que da Eva. ela tem de desafiar meus instintos mais ferinos, não apaziguá-los. fazer meus brios responderem daquela forma que só uma mulher completa de verdade pode fazer. mas não pode ser séria. meio menina, meio mulher, sempre nas horas e intensidades adequadas. altura? ah, sei lá... qualquer coisa entre 1,60 e 1,85. pode ser mais alta que você? o quê é que tem? é só um pouquinho... nada de mais. que tal um e setenta? um pouco baixa, mas está ótimo. e o nome? ela não precisa de nomes. mas sem um nome o programa não compila. ok, tá bom. eu pensei em algo meio escandinavo, meio leste europeu, talvez russo. é isso! russo. nome de agente espiã da KGB. a partir de agora ela se chamará... Natasha. enter...

viernes, mayo 11, 2007

divagar impreciso
Cem dias

parece cocaína, mas é só tristeza...
as constantes tentativas de manter esse sorriso amarelo-pálido na minha face têm se revelado extremamente desgastantes e cada vez mais inúteis. o peso de meus pensamentos e da minha tristeza parece crescer a cada dia que passo vendo as folhas do calendário caindo e meu tempo indo embora como a areia de uma ampulheta lacrada que não pode ser reposta. o trafegar de meus instintos, até então mantidos sob controle absoluto, padece de ansiedade e medo. gerando calafrios cada vez mais intensos na minha espinha e curvando-a em direção à gravidade. as maquiagens emocionais, os disfarces casuais e as máscaras que mantenho na face parecem não surtir mais efeito e minhas dores passam a eclodir de meus olhos como lava vulcânica. queimando todos os aparelhos internos de meu corpo, mas fazendo-me sentir, apenas, cada vez mais frio. perpetuando esse meu estado cíclico de humores dispares, eu chego a um vale. profundo, seco, gelado e escuro. e procuro, mas não encontro mais forças em meus membros para tornar a subir. o fundo do poço parece ter se instalado de forma permanente em minha alma. latejando com tanta força que minha natureza transparente não consegue mais se esconder entre minhas vestes e salta de meu peito. junto com essa dor que expele meu coração para fora do tórax quando ele se abre como uma flor e deixa cair pétala por pétala de minha sanidade ao relento das calçadas de mármore que rodeiam a estrada inóspita da solidão. a confusão se dissipa de minha mente, deixando apenas o vago. uma inércia imperativa que me suga por completo. deixando apenas uma carcaça vazia de semblante apático e atitude conformista. um negativo completo de tudo aquilo que sou. um toque fúnebre com sabor de desistência, de impotência. um olhar distante que persegue o horizonte. uma inexpressão estampada na face. um desejo incômodo de que tudo fosse diferente, de que eu fosse diferente. talvez outra pessoa. sensação de cansaço e vontade de desaparecer. a lei de Murphy, quando resolve atacar, vem de todos os lados e não te deixa respirar. e parece ter o poder de amplificar as tristezas mais particulares e sugar todas as crenças, as vontades e a confiança, até te deixar sem forças para reagir. sou eu, no olho de um furação feroz e sem espaço para sair. sem rota para fugir. tentando, inutilmente, me esconder do mundo a minha volta, dentro de mim mesmo. para quando sair do casulo, poder ter de volta as verdades que minha vida perdeu.

jueves, abril 26, 2007

espelhos
Abismo

Ela olha para baixo e enxerga a água turva sob seus pés. As lágrimas em seus olhos acusam as suas intenções. Ela realmente planeja pular. Quando o conheceu há apenas algumas semanas, uns dois meses sendo mais preciso, já imaginava a cena épica que estava prestes a realizar ali. O roteiro já sabia de cor e até o desenrolar dos acontecimentos vindouros já podia prever. Mas ela o conheceu. Aquela ponte era tão antiga que se passasse tempo demais pensando corria o risco de perder o direito de escolha. Ela odeia qualquer coisa que comprometa o seu livre-arbítrio. Sentir-se presa é pior do que a morte, e é por isso que veio até aqui. Maldita a hora em que resolveu ir até aquele show. Podia estar ainda livre, podia ser dona de si mesma. Mas não era mais. Sua vida desregrada a fazia feliz, apesar de tudo. Sentia-se bem com a falta de apego a tudo e a todos. Não mais agora. Ela o ama, e se odeia profundamente por isso. Sua vida, do dia para a noite, passou a fazer algum sentido. E todas as suas atitudes, festas, loucuras, seu adorado way of life, já não tinham a mesma graça. Encontrava ali um motivo para seguir em frente, para fazer planos e até para ter algumas responsabilidades. E isso era detestável. A irresponsabilidade, a porralouquice e a falta de limites já faziam parte de sua essência. Como mudar agora? Como mudar algo que não se quer mudar? Ela olha para baixo novamente e pensa duas vezes. Num momento como aquele, em circunstancias como aquelas, pensar duas vezes é muito. Uma vez e meia já seria o bastante para desistir. E ela se odeia por isso. Sai dali sorrateiramente e se afasta da maldita ponte, já condenada, antes que perca aquilo que mais preza na vida: sua liberdade de escolha. Ela teve medo ali. E não sabe conviver com isso. Vai ao seu encontro agora. Marcou de encontrá-lo em uma hora na sua casa. Foi embora sem realizar o que planejou fazer. Não se atirou. Pelo menos não hoje.