"you don't choose the things you believe in, they choose you."

Minority Report (2002)

lunes, marzo 27, 2006

aventuras de charlote
Onírica

Se não estivesse dormindo acharia que era louca. Estava perdida numa biblioteca tão grande que talvez não houvesse livros o bastante no mundo para preenchê-la por inteiro. Sabia que era um sonho porque seus sonhos são meio assim mesmo. Exagerados. E têm um clima meio super-8 também. Foi quando viu um unicórnio negro passando desde a sala de leitura em direção a um corredor. É... ela costuma ter sonhos estranhos mesmo. Talvez por causa das batatas fritas frias do drive tru do McDonalds, elas sempre a deixam de mau humor. Prometeu a si mesma que passaria a comer no Bob’s daqui pra frente enquanto tentava seguir o unicórnio através do corredor. Até se perder naquele labirinto de paredes coloridas. Percorreu os corredores cantarolando e assobiando, enquanto percebia as paredes mudando de cor. Passou por corredores escuros e salões que brilhavam de tão iluminados. Até chegar àquela porta amarela no fim de um corredor cinzento. Era de se esperar que fosse uma porta enorme e pesada, talvez com motivos estranhos e uma enorme gárgula na frente, mas era apenas uma porta de compensado de madeira. Deixou de lado o anticlímax daquele sonho e adentrou um quarto com paredes de madeira e poucos móveis. Havia várias janelas de onde se via um bosque iluminado de um lado e uma escura floresta do outro. Sobre a mesa no centro, um livro coberto de poeira e uma caixa. Soprou a poeira do livro que não tinha nome e tomou-o nas mãos para ler. Foi quando ouviu uma voz vindo lá de fora. Correu até a janela da direita e viu aquele homem barbudo e sisudo, sentado sobre uma nuvem bem abaixo do firmamento. Ele olhou firme nos seus olhos e sorriu. Voltou-se para o livro e viu, sobre o parapeito da outra janela, uma rosa. Ouviu um trovão e virou-se assustada. Ele já não estava mais ali. Abriu a janela, observou aquele céu limpo e azul e devolveu o sorriso. Lembrou-se da história de Pandora e abriu a pequena caixa sobre a mesa. Lá estava ela. A esperança. Junto a algo mais. Zeus havia deixado-lhe um presente. Foi até a janela à esquerda buscar a rosa e viu do lado de fora o unicórnio que seguira até ali. Montado sobre ele, um homem. Um homem sem face. Vestido de negro, com um sobretudo e um chapéu verde-musgo. Ele abriu a janela e dirigiu-se a ela em silêncio. Encostou-se na janela e, apesar da ausência de um rosto, ela conseguiu perceber o sorriso que nasceu de seus lábios. O vento forte bateu a janela e, ao abri-la novamente, não havia mais nada. A não ser a velha floresta escura e coberta de neve. Guardou a rosa entre as páginas do livro, deitou-se próximo à lareira e dormiu. Acordou de manhã em seu quarto, e correu para a janela onde se via um belo céu de poucas nuvens. Sobre a cama havia um livro, com uma rosa dentro. Embaixo dela, uma caixa. E entre os lençóis, o presente de Zeus. Lembrou do homem sem face e sorriu com o livro em suas mãos. Não esperaria vê-lo de novo e descobrir o seu rosto, mas guardaria consigo a certeza de que um dia, quando menos esperasse, isso aconteceria. Charlote era apenas uma menina, mas tinha a beleza de uma mulher feita e a certeza de quem sabia muito bem o que queria viver.