"you don't choose the things you believe in, they choose you."

Minority Report (2002)

sábado, noviembre 06, 2004

três pontos
Conjuntiva

A última parte de minha personalidade que se perdeu em meio aos vasos sanguíneos que irrigam meu cérebro preguiçoso levou consigo um pedaço ainda maior desta minha já reduzida vontade de retomar as rédeas do meu corpo e reabastecer os meus sonhos, outrora tão grandes. Meus instintos vão tateando cada pedaço do meu âmago na tentativa infrutífera de encontrar qualquer parte de meu ser que se disponha a abandonar o tutano e emergir à epiderme para recobrar-me a forma. Mas tudo que se pode sentir em meu interior é essa alma retraída e cansada que se recusa a levar os olhos à janela com medo de observar o mundo. Fazendo deste corpo meu cárcere privado. Uma carcaça aparentemente vazia e desprovida de ânimo. Uma máquina inoperante aguardando manutenção. Não há nada que o tempo não cure, mesmo que de forma falha e deformada. Busco, num último suspiro consciente, atravessar a porta que separa os corredores úmidos de minha mente, obscurecida pelas teorias incautas e incompletas que ainda teimam em ecoar por entre os vãos de minhas vísceras, enquanto às mesmas se liquefazem em pavor, até alcançar a luz opaca que incide do outro lado. Erguer a cabeça e fitar o olhar vermelho no espelho até convencê-lo, da forma mais incisiva que estiver ao meu alcance, de que ele não passa de uma grande fraude. Para enfim voltar a dormir e, com a mente despoluída de minha própria maldade, esperar para abrir os olhos quando as paredes brancas do meu quarto não mais me ofuscarem com esse brilho escarlate.